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Por que o Brasil entrou na Segunda Grande Guerra

Livro-reportagem detalha histórias de quem viveu de perto o episódio que jogou o país no conflito.

A entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial completa 70 anos em agosto de 2012. A decisão foi tomada pelo então presidente Getúlio Vargas depois que o submarino alemão U-507 torpedeou cinco navios nacionais, no litoral de Sergipe e da Bahia, entre os dias 15 e 17 de agosto de1942, causando a morte de 607 brasileiros. Uma semana depois, Vargas decretou estado de beligerância à Alemanha e à Itália e, no dia 31 de agosto, declarou guerra.

O episódio, ainda pouco conhecido dos brasileiros, é o tema do livro-reportagem U-507 – O submarino que afundou o Brasil na Segunda Guerra, que marca a estréia no mercado editorial do jornalista gaúcho Marcelo Monteiro, pela Editora Schoba, com prefácio de Luis Fernando Verissimo. A obra, que será lançada oficialmente em 16 de agosto de 2012, na Bienal do Livro, em São Paulo, é resultado de três anos e meio de pesquisas e entrevistas.

Com 344 páginas, o livro-reportagem revela em detalhes os afundamentos dos mercantes Baependy, Araraquara, Aníbal Benévolo, Itagiba e Arará, mostrando o sofrimento das vítimas da carnificina nazista. A narrativa conta o drama de náufragos devorados por tubarões, de sobreviventes vagando por mais de dois dias sem água ou comida e da menininha que sobreviveu ao afundamento do Itagiba boiando por horas dentro de uma caixa de madeira vazia.

O Baependy, um navio de 4.800 toneladas, foi a primeira vítima do submarino alemão U-507 no sangrento agosto de 1942. Passavam poucos minutos das 19 horas do dia 15 quando um torpedo interrompeu a festa do aniversário de um dos tripulantes, embalada por um animado trio de sax, piano e bateria. Minutos depois, o comandante nazista, Harro Schacht, ordenou o disparo de um segundo projétil. No ataque, o mais letal já registrado contra a navegação costeira brasileira, morreram 318 pessoas.

Até a agressão nazista na costa nordestina, o Brasil procurava manter-se neutro no conflito. Mas, depois de romper relações diplomáticas com o Eixo — em função do ataque à base americana de Pearl Harbor, em dezembro anterior —, o País colaborava com o esforço de guerra ianque, exportando borracha e outros itens essenciais à indústria bélica dos Estados Unidos. Após o ataque aos navios brasileiros e diante da revolta da população, que saiu às ruas em protesto, depredando estabelecimentos comerciais pertencentes a imigrantes alemães, italianos e japoneses, Vargas viu-se obrigado a abandonar a condição de não beligerante.

Diário de bordo nazista — Além de entrevistar sobreviventes dos naufrágios, Monteiro teve acesso ao diário de bordo de Harro Schacht, comandante do submarino alemão. Assim, junto com a rotina nos navios afundados, o livro também detalha, com base nos documentos nazistas, o cotidiano do próprio submersível, corrigindo alguns equívocos históricos, como o de que todos os vapores brasileiros teriam sido afundados com dois torpedos (somente o Baependy recebeu dois disparos) e trazendo uma nova — e talvez definitiva — versão para o episódio.

Salva por uma caixa — Entre os personagens entrevistados pelo autor está a alagoana Walderez Cavalcante, de 74 anos. Em 1942, com apenas quatro anos de idade, ela foi resgatada do naufrágio do Itagiba depois de permanecer cerca de quatro horas boiando dentro de uma caixa de transporte de Leite Moça. “O pessoal da baleeira me botou numa caixa de leite condensado da Nestlé, vazia, e me disse: ‘Segure, não solte’”, lembra a psicóloga aposentada.

A imagem da pequena Walderez, com toda a aura de dramaticidade que envolveu o seu salvamento, foi usada pelo governo de Getúlio Vargas como forma de chamar a atenção da população para a brutalidade dos ataques alemães, justificando, dessa forma, a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial. O seu retrato, com o braço quebrado, ao lado do pai, o moço de convés Octávio Cavalcante, hospitalizado, era a própria imagem do Brasil, vítima da covardia nazista. Além de aparecer na capa de alguns jornais, “com os dedinhos fazendo o ‘V’ da vitória, que não poderá deixar de vir”, o drama de Walderez também ganhou destaque em uma edição do Cine Jornal, programa noticioso elaborado pelo Departamento de Imprensa e Propaganda e exibido antes das sessões de cinema, aumentando a ira popular em relação ao ataque desferido pelo submarino nazista U-507.

As tragédias de Vera — Após o naufrágio do Itagiba, Walderez foi fotografada junto com outra menina, Vera Beatriz do Canto, filha do capitão do Exército José Tito do Canto, na cidade de Valença, no sul baiano, local para onde foram levados os náufragos. Também com quatro anos de idade, Vera viveu uma grande tragédia pessoal naquele 17 de agosto de 1942: colocada em um barco salva-vidas, viu um soldado pisar sobre o pé de seu bonequinho e quebrá-lo, durante o naufrágio do Itagiba.  “Para mim, isso foi uma tragédia”, conta Vera. “Eu abri o maior berreiro, e disso eu me lembro. Depois, a pessoa que estava comandando a baleeira (barco salva-vidas) pediu um pano branco para servir como bandeira de paz. Como ninguém tinha um pano branco, a roupa do meu boneco, que foi minha avó paterna quem fez — era de um rosa assim bem clarinho —, acabou sendo usada. Despiram o meu boneco, o que foi outra tragédia para mim.”

Em janeiro de 1943, cinco meses após o episódio, a imagem de Vera Beatriz e de Walderez, juntas, em uma escadaria na cidade de Valença, seria usada para ilustrar o livro Agressão — Documentário dos fatos que levaram o Brasil à guerra, novamente com o sentido de aumentar a ira popular contra os nazistas. Editada pela Imprensa Nacional, a obra trazia, além dos relatos de sobreviventes dos cinco torpedeamentos, as listas completas de mortos e sobreviventes nos naufrágios.

Reencontro sete décadas depois — Em 2011, dentro do trabalho de reportagem realizado para a produção do livro U-507 - O submarino que afundou o Brasil na Segunda Guerra Mundial, a alagoana Walderez e a paulista Vera Beatriz reencontraram-se, no Rio de Janeiro, quase sete décadas após o ataque do U-boot nazista. Durante dois dias, as duas emocionaram-se, riram, choraram e trocaram palavras e demonstrações de afeto. “Nas maiores fantasias que pudesse ter feito em toda a minha existência, embora muitas vezes eu tenha pensado onde estaria a Walderez, nunca pensei que um dia a vida nos trouxesse novamente à presença uma da outra”, comentou Vera, 74 anos, aposentada depois de 27 anos de trabalho no Banco do Brasil.

Estranha premonição — Dias antes do ataque do U-507 aos navios brasileiros, a mãe de Vera Beatriz, Noêmia, tivera um pesadelo: vira um navio preto, com centenas de pessoas vestindo preto e com um número 13 estampado no casco. No dia 13 de agosto de 1942, às 13 horas, o Itagiba partiu do armazém 13 do cais do porto do Rio de Janeiro em direção a Salvador. Essa seria a sua última viagem. No dia 17, duas horas antes da chegada a Salvador, o vapor foi alvejado pelo submarino nazista, próximo ao Morro de São Paulo, no litoral baiano. “Minha Nossa Senhora Medianeira!”, exclamou Noêmia, ao se dar conta das coincidências.

A vingança do soldado — Dálvaro José de Oliveira era um dos soldados da tropa comandada pelo pai de Vera Beatriz, que estava sendo transferida do Rio para Olinda (PE), onde seria formado o 7º Grupo de Artilharia de Dorso. Outro contingente de militares do mesmo pelotão seguia no Baependy, que partira dois dias antes do Itagiba. No dia 15, o Baependy foi torpedeado. O Itagiba teria o mesmo destino no dia 17. Centenas de militares perderam a vida nos dois ataques alemães.

Depois de ver um amigo — à distância de um metro — ser devorado por um tubarão, Oliveira, junto com os colegas de pelotão, jurou vingança aos nazistas, às margens do Rio Una, em Valença, cidade para onde foram levados os náufragos e feridos. Dois anos depois, em 1944, o soldado embarcou para a Itália, onde ajudou a eliminar o nazifascismo. “Nossa vitória na guerra foi uma homenagem àqueles que morreram, inocentemente, nos navios mercantes brasileiros”, diz Oliveira, hoje com 92 anos, que até 2011 presidia a  Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira (ANVFEB).

Carta para um herói — A tragédia que vitimou o Itagiba uniu vários destinos. O capitão do navio, José Ricardo Nunes, e o comandante do pelotão do Grupo de Artilharia de Dorso, o capitão José Tito do Canto, ambos já falecidos, foram os últimos a deixar o navio. No momento em que o Itagiba adernava, Tito do Canto pediu a Nunes que colocasse a esposa, Noêmia, e a filha, Vera Beatriz, na baleeira, enquanto ele próprio tentaria salvar os seus comandados, que gritavam por socorro.

Em carta enviada por Nunes a Tito do Canto em 8 de maio de 1944, escrita em papel timbrado da Organização Henrique Lage, proprietária da Companhia Nacional de Navegação Costeira, o comandante do Itagiba respondeu à correspondência remetida pelo militar dias antes, em 23 de abril. Além de fazer uma eloquente declaração de amizade, Nunes lamentava o fato de o planeta estar mergulhado em uma guerra mundial e elogiava a bravura de Tito do Canto durante o afundamento. A amizade entre os dois foi tanta que, posteriormente, o militar viria a batizar um de seus filhos com o nome de “José Ricardo”.

Confira um trecho da carta: “No dia 23 de abril teve o meu grande amigo a lembrança de me escrever a primeira carta. Dia 23 de abril é o Dia de São Jorge e neste mesmo dia, no ano de 1900, minha querida mãe me lançou neste mundo de misérias, neste planeta atrasado que a humanidade cognominou TERRA. Apesar dos sofrimentos que tenho passado, grandes alegrias eu tenho também sentido. Uma das maiores alegrias que tenho ainda guardada no meu coração foi ter salvo a sua boa e querida esposa D. Noêmia e a sua linda e extremosa filhinha Vera Beatriz. (...)
Eu me senti e me sentirei sempre orgulhoso de possuir a amizade de meu grande e valente Capitão Canto. Não poderei esquecer jamais a sua coragem. Um homem que entrega sua esposa e sua filhinha em um momento tão crítico ao capitão do navio e vai cuidar dos seus soldados até o momento em que o Itagiba afundou, este homem não se pode chamar somente um grande homem e sim um grande herói. Eis a razão por que eu jamais esquecerei o meu grande e valente Capitão Canto.”

Pré-venda — Embora o lançamento oficial esteja previsto para a Bienal do Livro, em agosto, a obra chegará às principais livrarias até a primeira semana de junho. Antes disso, porém, o livro já pode ser adquirido, em sistema de pré-venda, pelo site da Editora Schoba (http://www.editoraschoba.com.br/detalhe-livro.php?id=251), ao preço de R$ 49, não incluídas as despesas de envio. No mesmo site, é possível folhear e ler as primeiras páginas do livro. Já na página do U-507 no Facebook (http://www.facebook.com/livroU507), são publicadas atualizações diárias, com fotos históricas e alguns trechos do livro.

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